quarta-feira, novembro 02, 2005

Os olhares de um cego

Olho, por mais que não queira, incessantemente, inevitavelmente, como que com uma pequena réstia de que surja no horizonte do meu olhar a prova de que afinal ainda vale a pena, de que ainda algo é possível.

Olho, mas apenas por olhar, sem qualquer vontade nem intenção, ciente de que ali nada há que não existisse noutro momento, noutro tempo, noutros olhares.

Olho, indiferente. Indiferentemente.

Olho, de pálpebras cerradas, de sonhos fechados, de ilusões enterradas.

Deixei de olhar.

Fechei os olhos de vez e morri. Perdi-me no meu próprio mundo.

Não. Não me acordem. Deixem-me assim, consciente, inconsciente, morto e inerte, para não ter de olhar mais… para nada ver.

Deixem-me assim, suspenso no vazio que se tornou o meu olhar. Cego, assim, não quero viver.

Deixem morrer o corpo, deixem morrer a alma, deixem, porque o meu olhar já morreu. E, cego assim não quero viver.